sábado, 16 de abril de 2011

RESISTA À TENTAÇÃO DE PERTENCER A UM GRUPO

Em geral as pessoas estão acostumadas a interagir em espaços proprietários (fechados), não em redes (abertas). Não estão abertas à interação com o que chamei de outro-imprevisível. Por isso fazem escolas, erigem igrejas, urdem corporações e partidos e servem à instituições hierárquicas (sejam sociais, estatais ou empresariais). E, às vezes, seu quadradinho é um espaço proprietário virtual, um blog ou uma página no Facebook.
 
Mesmo quando se aventuram a fazer redes, as pessoas, em geral, organizam grupos proprietários, estabelecem contextos que separam quem está dentro de quem está fora, criam sulcos que acabam disciplinando a interação por meio de regras (muitas vezes tácitas, mas não por isso menos efetivas), de um glossário próprio (pelo qual ressignificam os termos que usam recorrentemente gerando algum tipo de jargão) não importando para nada se esta “wikipédia” (ou “contextopedia”) privada está ou não publicada em um site aberto ou fechado; enfim, fazem tudo para promover o seu grupo – às vezes chamado de comunidade – à condição de instância mais estratégica do que as demais (os outros ambientes em que interagem, inclusive as mídias sociais onde se registram). Este é um dos motivos pelos quais sua interação nesses outros ambientes é, em geral, tão pouco intensa ou tão pouco frequente. Pudera! Seu tempo está tomado pelo seu próprio grupo (seja uma organização da sociedade formal ou informal, seja um órgão estatal, seja uma empresa).

E o mais interessante é que, muitas vezes, essas pessoas estão convencidas intelectualmente de que devem se organizar em rede. Não raro denominam de redes suas organizações hierárquicas ou seus grupos proprietários. Não estão – em sua maioria – mentindo ou fazendo propaganda enganosa. Elas acreditam mesmo que suas organizações sejam redes, desde que seus membros estejam convencidos (ou “tenham consciência”) de que agora entramos na era das redes (por algum motivo elas acham que consciência é algo capaz de determinar comportamentos coletivos).

Chega a ser fascinante observar como essas pessoas não conseguem viver fora do seu quadrado. E como racionalizam tal aprisionamento lançando mão das mais variadas teorias sociológicas sobre grupos (a sociologia vem aqui, não raro, como um socorro contra a política, como uma proteção contra a experiência direta de uma política não-autocrática). Ah! é difícil, como é difícil se atirar na correnteza quando é tão mais fácil construir diques e ficar boiando na tranquilidade da represa!

Pois bem. Tudo isso – que já foi dito e repisado, por mim e por outros, nos últimos dois anos – me leva agora a refletir sobre o seguinte: se quiserem realmente tecer redes as pessoas não devem se agregar a outras pessoas em grupos proprietários, comunidades exclusivas, inner circles, bunkers para se proteger do mundo exterior ou outras formas de organização constituídas na base do “cada um no seu quadrado”. Sim, pode parecer surpreendentemente contraditório, à primeira vista, dizer o que vou dizer agora:

Se você quer fazer redes, resista a tentação de pertencer a um grupo.

Se você se deixa capturar por um grupo ou se põe a capturar outras pessoas para um grupo (que seja considerado – ou funcione como, dá no mesmo – o seu grupo), então você terá imensas dificuldades de interagir em rede de modo mais distribuído do que centralizado. Se você quer, porque acha que precisa, porque sente, às vezes desesperadamente, a vontade de se juntar a outras pessoas para executar algum projeto coletivo, compartilhar com elas suas ideias, seus sonhos (e também suas ansiedades), somar esforços, apoiar e receber apoio praticando a ajuda-mútua dentro de um campo de cumplicidade, enfim, constituir um grupo e coesioná-lo a partir de uma visão comum, de um “falar a mesma língua”, de uma sintonia fina de sentimentos e emoções, então se prepare para fazer o mais difícil: matar essa vontade!

Simplesmente mate essa vontade. Se preciso, vá para o deserto e passe um tempo lá. Se você já está conectado a outras pessoas, por que diabos quer também forçar uma clusterização que selecionará a priori algumas conexões como mais fortes do que outras, alguns caminhos como mais válidos do que outros, alguns planos feitos intra muros (quer dizer, dentro daquele clusterzinho que foi urdido antes da interação) como mais estratégicos do que outros?

Não há qualquer problema em se reunir com muitos grupos para propósitos diversos, públicos ou privados, interagir em vários aglomerados, atuar coletivamente em várias instâncias. O problema só surge quando você faz tudo isso não a partir de você mesmo, mas sempre a partir de um grupo que encara os demais ambientes coletivos como campo de atuação (e uma atuação inevitavelmente tática, mesmo quando você proteste o contrário) desse grupo.

Trabalhar em rede distribuída é diferente de trabalhar num grupo proprietário, numa organização nuclear que compartilha uma visão comum e exige essa visão comum para continuar interagindo. Na verdade, o problema está na construção de mundos baseados na participação.

Portanto, se você quer experimentar redes (mais distribuídas do que centralizadas), nada de grupo participativo, nada de chegar a algum formato com base em participação. Redes não são ambientes de participação e sim de interação. Não temos que decidir o que todos farão em bloco. Vamos interagir e ver o que acontece. O formato final de qualquer ação coletiva será sempre uma combinação fractal, emergente, de certo modo inédita e imprevisível, das contribuições de cada um.

Em outras palavras, se você quer fazer redes não pode esquecer jamais uma coisa: você é uma pessoa. Paulo Brabo (2007), em um texto que não me canso de citar, escreveu assim:
A primeira coisa a fazer, se você ainda não fez, é desiludir-se por completo de todas as iniciativas comunitárias ou governamentais, por mais bem intencionadas que sejam, e raramente são. Esqueça, meu caro discípulo, o coletivo. A salvação não virá de ongs ou ogs, Gogues ou Magogues, poderes ou potestades. A salvação não virá de igrejas, assembleias, organizações de bairro, sindicatos, asilos, orfanatos ou campanhas de assistência. As ongs têm a tremenda virtude de não serem governamentais, mas contam com a imperdoável falha de serem organizações. Repita comigo: as instituições não existem. Só existem pessoas.
É claro que é necessário entender o contexto confessional (ou teologal) em que Brabo escreveu sua bela homilia herética e fixar-se nas suas mensagens centrais: desiluda-se por completo das iniciativas comunitárias, esqueça o coletivo, reconheça a imperdoável falha das organizações (aquela que deriva do fato de serem organizações) e convença-se de que as instituições não existem: só existem pessoas.

Fale como uma pessoa. Seja uma pessoa. Não aja como se fosse um grupo, um projeto, uma organização (nem mesmo tuite como se fosse uma coletividade abstrata). Uma pessoa jurídica é uma pessoa imaginária (ou seja, uma não-pessoa). A vida gastou 3,9 bilhões de anos e as coletividades humanas formadas pela convivência gastaram uns 300 mil anos para constituírem essa tão surpreendente quanto improvável realidade que somos (o humano, a pessoa: o encontro fortuito do simbionte natural em evolução com o simbionte social em prefiguração) e na hora em que vamos nos apresentar a alguém, sobretudo a alguma coletividade, temos vergonha de dizer que somos “apenas” uma pessoa e preferimos declarar que estamos representando alguma dessas organizações vagabundas que, em média, não conseguem sobreviver mais do que poucos anos e que, além de tudo, são não-humanas, quando não desumanas.

Mas… atenção! Pessoa não é o mesmo que a abstração chamada indivíduo. Redes sociais não são redes de indivíduos e sim de pessoas. O conjunto dos pensionistas do previdência social não constitui uma rede social, assim como não constitui uma rede social a população de um país. O social, como sempre dizemos, não é a coleção dos indivíduos e sim as configurações móveis geradas a partir do que ocorre entre eles (que, então, deixam de ser indivíduos para passar a ser pessoas). Quando interagimos, tornamos-nos pessoas. Assim, pessoa já é rede.

Se você não tem liberdade para interagir nos seus próprios termos, como uma pessoa, se você diz: “vou consultar primeiro meu chefe ou meus companheiros” antes de decidir sobre isso ou aquilo, então sua porção-borg cresce e sua porção-social diminui. Em outras palavras, sua porção-rebanho cresce e sua porção-pessoa diminui. Em outras palavras, ainda: você perde um pouco daquela qualidade da alma que chamamos de humanidade.

Se você se define como participante de qualquer grupo, quer dizer, restringe suas possibilidades de interagir para se enquadrar nos termos já estabelecidos por outrem (ou, até, por você mesmo, porém antes da interação), então você terá muitas dificuldades de entender, experimentar e atuar em rede (distribuída).
Toda realização em rede distribuída é um projeto que vai se construindo à medida que avança, que vai se formando ao sabor de fluzz, que vai gerando ordem a partir – e no ritmo – da interação. Em tal contexto é desnecessário, a rigor, combinar antes o script. É inútil – e frequentemente contraproducente – mobilizar energia para direcionar um grupo.

Se você quer fazer redes, nada de formar uma comunidade que vá além do seu propósito específico e declarado (como se fosse um comunidade de destino). Não existe ‘a’ comunidade: existem múltiplas, diversas, comunidades. Se você acha que existe aquela comunidade que é ‘a’ comunidade (porque é “a sua”, a escolhida, a predestinável), é sinal de que você se deixou aprisionar por um grupo (às vezes uma prisão que você mesmo engendrou). E aí não vão tardar a surgir aquelas manifestações horríveis de pertencimento exclusivo, de fidelidade… Mesmo que você aceite o direto de uma pessoa de abandonar uma comunidade, isso não basta. É necessário aceitar o direito de uma pessoa de pertencer a várias comunidades ao mesmo tempo! Ou seja, é necessário desconstituir a cultura (ou quebrar a linha de transmissão de comportamento) do “cada um no seu quadrado”.

Você já notou que este direito não é reconhecido nas organizações hierárquicas, mesmo nas privadas, como os partidos e as empresas? Nas empresas esse direito só existe para os donos ou acionistas. Quando lhe pagam um salário, é como se dissessem: “comprei você e agora você é meu; nada de transar fora do meu quadrado”.

Se você quer fazer redes, nada de alinhar visões. Na maioria das organizações burocráticas, sejam sociais, empresariais ou governamentais, o tempo das pessoas é gasto em reuniões para alinhamento (ou seja, agrupamentos forçados para discutir como realizar melhor as diretivas estabelecidas por cima ou por fora da sua interação). Mal saem de uma reunião os “colaboradores” (um eufemismo empresarial para empregados, quer dizer, subordinados) já entram em outra reunião. E assim passam o dia: entre o computador, o banheiro, o café e as indefectíveis reuniões. Revela-se óbvio o motivo de tais reuniões: são ambientes de direcionamento voltados à reprodução de comportamentos, são campos de adestramento, são artifícios para proteger as pessoas da experiência de empreender, de criar, de inovar.

Se você quer fazer redes, nada de virar escola, nem mesmo escola de pensamento. As comunidades ditas de livre adesão, em sua maioria, são algum tipo de escola de pensamento, ou de igreja, ou de corporação, ou de partido, ou de alguma coisa que exija que você adote e professe uma visão coletivamente construída para pertencer ao grupo e poder falar em seu nome. Mas se você quer fazer redes, nada de criar coesões que separem os de dentro dos de fora.

Estar em rede é sempre uma aposta: a aposta de que da nossa interação desorganizada vai surgir algo interessante, não antes, no ensaio (“a vida é beta”, como diz o Silvio Meira), mas sobretudo ali, na hora exata em que ocorre, bottom up.

Augusto de Franco, ministro e poeta da revolução descentralizada

terça-feira, 8 de março de 2011

Deus e sua seleção anti-natural



Seleção natural: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sele%C3%A7%C3%A3o_natural

Estou meio distante dos debates internetianos, tenho dado a mim um pouco de férias.

Após diversas notícias de acidentes e mortes, volto em meu blog e me deparo com meus últimos posts, que falam exatamente destas relações entre tragédias, deuses, pessoas que se foram e pessoas que ficam e tentam superar a dor de ver partir aquele(a) pessoa que amava.

Uma notícia que li neste carnaval em um jornal do Espírito Santo me fez lembrar que os assuntos continuam os mesmos.

Dois carros, bateram de frente.

Em um dos carros haviam duas pessoas que morreram, no outro, quatro pessoas que permaneceram vivas.

Uma pessoa conhecida da família que sobreviveu diz ao repórter: "Só pode ter sido Deus, senão teriam morrido".

E eu mais uma vez me pergunto. Esta pessoa não estava vendo o outro carro? Com duas pessoas mortas?

Que Diabo de Deus bonzinho é este, que não deixou nenhum dos quatro morrerem e não estava nem aí para os outros dois envolvidos no acidente?

Que mania de dizer que Deus está aleatoriamente salvando uma vida aqui outra acolá porque ele "sabe" o que faz.

Quando a sociedade vai perceber que não existe influência metafísica sobre a matéria? É a mesma história que envolve a paranormalidade, onde pessoas acreditam que conseguem mover objetos com o pensamento. Até hoje ninguém conseguiu provar estas coisas.

Enquanto isto eu vou lendo nos jornais e vendo nos canais de TV a seleção de deus em ação, matando uns, deixando morrer outros, poupando outros.

Estou passando o carnaval em Anchieta, amanhã volto pra casa. Não é longe, são 70Km, sei que tenho que estar atento na estrada porque pode restar algum bebum voltando para casa.

Mas, se algum carro perder a direção e vier para cima de mim terei que usar toda minha capacidade de pilotagem para tentar evitar um acidente, apenas sei que nenhum deus vai pegar meu carro e suspendê-lo para evitar o impacto.

Uma boa noite para todos nós.


Imagem: http://autozine.com.br/fotos/super-carros-batidos
Odlave Sreklow.

domingo, 16 de janeiro de 2011

O Deus dos sobreviventes



Estava deitado, assistindo a uma reportagem sobre a morte de três bombeiros que trabalhavam nos resgates no Rio de Janeiro.
Foi quando pude assistir à entrevista feita a um dos bombeiros sobreviventes ao desabamento que surpreendera seu grupo.
Segue a frase dita pelo bombeiro sobrevivente:
"Perdemos três companheiros, eu tive sorte de sobreviver graças à interferência direta de Deus".
Estas frases e sentimentos são comuns a sobreviventes de desastres, não consigo entender porque algumas pessoas se acham no direito de serem "divinamente" livradas da morte, enquanto outras não tem a mesma sorte.

Ontem um tio meu estava contando que leu uma notícia no jornal que relatava um acidente com dois irmãos em uma moto onde o piloto sobreviveu. Segue frase dita pelo piloto da moto:
"Graças a Deus eu não sofri nenhum arranhão".
O pior é que seu irmão que estava na garupa da moto estava morto ali no chão, próximo a ele.

Este tipo de entrevista é comum, será que nosso cérebro está programado para acreditar que um ser amoroso e misericordioso fora responsável pela nossa sobrevivência a desastres enquanto este mesmo ser torna-se indiferente quanto a outros ao nosso redor?

Li uma reportagem no jornal A Tribuna de ontem onde estava relatada uma "experiência" de uma família evangélica. Não lembro exatamente se eles perderam familiares nos desabamentos ocorridos no Rio de Janeiro ou se receberam notícias que estavam vivos. Disseram que iriam viajar para lá.
Uma jovem, ao receber a notícia sobre os familiares, abrira a Bíblia em Isaías 40, onde lê-se "Consolai, consolai o meu povo, diz o vosso Deus.".
Estavam se preparando para ir ao Rio, porém, foram à igreja naquela noite e "Deus" falou com eles: "Vocês não devem ir ao Rio de Janeiro amanhã porque se forem irão morrer na estrada".
Imagino eu o quanto estas pessoas se acharam importantes para "Deus", pois, "Deus" esquecera de fazer o mesmo com as seiscentas pessoas que morreram no Rio. "Deus" utilizou sua infinita capacidade de onisciência para salvar uma família, aleluia, enquanto isto, ele não fora capaz de avisar aqueles que foram soterrados.
Somente pelo pequeno trecho da entrevista desta jovem evangélica já deduzi qual igreja ela frequenta (não vou comentar porque não vem ao caso).
Mas é algo típico desta determinada igreja evangélica, e, sem obter detalhes de como "Deus" havia feito o comunicado posso dar meu relato de como deve ter ocorrido.
Creio que esta família foi ao culto para cumprir agenda. Estavam tristes e debilitados com as notícias recebidas sobre os familiares. Ao término do culto devem ter chamado um daqueles que vestem paletó e oram colocando a mão na cabeça das pessoas e disseram: "Nós pretendemos ir ao Rio amanhã mas gostaríamos de consultar a 'Deus' para saber se podemos ir". Em seguida ajoelham, enquanto juntam-se ao homem de paletó mais algumas pessoas (todas influenciadas por dezenas de notícias que estão sendo exibidas a semana toda), e, após orarem pela família que pretendia viajar, um daqueles que estavam de pé, orando pelos ajoelhados diz: "O Senhor me revelou que vocês não devem viajar porque senão irão morrer na estrada", ou pode ter sido: "Quando orávamos por eles, o Senhor me deu uma visão onde eu via o transporte que eles estavam (isso quando não dizem de que vão viajar) sofria um acidente e todos morriam".

Pois é, assim caminha a humanidade, onde o "Deus" todo-poderoso seleciona quem ele quer que continue vivendo ou não.

É mais fácil ir se iludindo assim do que acreditar que não há nenhuma interferência "divina" diante das calamidades e catástrofes da vida.

Mas nem tudo está perdido. Vi uma outra entrevista a uns dias atrás onde uma senhora estava sentada em um banco de praça chorando e disse: "Na minha vizinhança apenas minha casa ficou de pé, saímos correndo, desesperados, muito barulho, meus vizinhos perderam tudo, meu Deus, o que vai ser deles?". Isso mesmo, este é o tipo de pessoa difícil de se encontrar, a pessoa realista, que se preocupa com o próximo. Porque o comum seria ela dizer: "Graças a Deus que minha casa não desabou, aleluia, Deus é bom." sem mesmo se preocupar com os vizinhos. Daí concluo que esta senhora não seja uma "serva de Deus", porque se fosse,  ela não perderia a oportunidade de exaltar ao seu "Deus" por ter colocado as "mãos" sobre sua casa.

Fim do relato.

Odlave Sreklow.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Mega Sena da Virada com Fé!!!



Já estou me preparando para a Mega Sena da virada.

Afinal de contas,  ser sorteado requer muita fé (uma ajudinha cai muito bem).

Comecei minha jornada espiritual com o deus dos cristãos. Entrei em uma igreja evangélica, disse pra ele que se eu ganhar aceitarei seu filho como meu único e suficiente salvador. Repeti a dose em uma igreja católica, afinal de contas, não sabia exatamente em qual das duas ele estaria. Faltava agora ir a um centro espírita cristão. Lá prometi ao mesmo deus que farei de tudo para ser um bom menino na próxima encarnação.

Próxima etapa foi em uma mesquita islâmica. Lá prometi a Alá que, se ganhar recitarei o Alcorão em seu texto original (terei que aprender árabe) todos os dias de minha vida.

Fui a um terreiro de umbanda, lá prometi a todos orixás que matarei 7 galinhas pretas todas as sextas feiras que sejam dia 7 durante toda minha vida.

Fui a um mosteiro budista, lá prometi a mim mesmo que me tornaria mais zen, dedicando minha vida em direção ao Nirvana e que só ouviria músicas de tal banda (rsrs).

Fui à Índia, prometi a Brahma que não beberia mais Skol ou Antarctica.

Não poderia esquecer de Odin, prometi que ressuscitaria toda mitologia nórdica e que todos reconheceriam sua divindade.

Foi assim com Zeus, Hórus, Quetzacóatl e tantos outros.

E assim segui minha jornada, convencendo a cada deus/divindade de cada religião existente que realmente valia a pena me ajudar com a Mega Sena da virada.

Caso ganhe, acreditarei em todos eles, principalmente porque vou jogar apenas um bilhete no valor de R$ 2,00.

Depois disto tudo me perguntaram se eu conseguiria agradar a todos após ganhar o prêmio.

Claro que não, só vou agradar aquele que me provar cientificamente que realmente teve participação quanto ao resultado, fora isto, nada feito.

Abraços,

Odlave Sreklow.

Imagem: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhC-jS8rymZXlq1-Sed2_8N0NkDQl4r9gh2UXqEe5bgxhfOdv57AgN2E_24Wj9h2YIlzRLdSwQq41aYrBS2yvwsvYYl-FfqN5SLJDMnRYjCr0j6cpUtjZ6iJknV1aJxt4nluIg-F4kc2Ys/s320/LOADIN_2.JPG

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Deus é argentino



Final da sul-americana de 2010, Independiente é campeão.

Apesar de ter jogado muito bem o Goiás perde nas penalidades.

As palavras de Harlei, goleiro do Goiás foram: "Deus quis assim".

Em casa, o Goiás ganhou de 2 a 0, já na Argentina, no tempo normal ficou de 3 a 1 para os donos da casa.

Na prorrogação não aconteceram gols.

Goiás mandou até bola na trave (quaaaaseeeee).

O problema é que a danada procurou a trave novamente na cobrança do pênalti de Felipe.

O Goiás tinha tudo para ganhar, mas se Deus queria a vitória do Independiente, como disse Harlei, infelizmente não dava para o Goiás.

O que é uma grande desvantagem porque provavelmente Deus colocou arcanjos e querubins para não deixar a bola entrar.

Ainda bem que não foi o Flamengo, porque senão eu ia ter uma conversa séria com este Deus sacana que não deixa a gente disputar uma partida limpa sem meter o "bedelho".

Obs.: Prestou atenção no mascote do Independiente? Será que Deus não quis ou simplesmente não aguentou a pressão?

Imagem: http://www.independiente.com/

Odlave Sreklow.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

PORQUE NÃO ACREDITO EM DEUS

Atualmente estou meio "desviado" do meu blog, enrolado com trabalho e estudos. Encontrei este texto a uns dias atrás no blog do Petrus e solicitei a ele permissão para postar. Como já recebi sua autorização, aí está. Abraços.






Porque não acredito em deus

Sempre fui muito subjetivo em falar sobre deus, com textos metafóricos, contos e poesias, falei sobre o divino e o além. Então, resolvi escrever claramente sobre os motivos de não crer em espíritos, numa vida além, um pai celeste que me ama e quer me salvar. Listarei os pontos e os comentarei:

- A voz de deus não me responde

Os fiéis dirão que eu não ouço deus porque não acredito. Preciso crer. Mas, quando eu acreditava e me esforçava para ser ouvido e acreditava que deus falava comigo através de mensagens eu também nada ouvia. Quando criança, uma ingênua criança do senhor, eu falava com deus e esperava suas respostas, mas ele não me respondia e quando eu tinha ideias ou coisas aconteciam, eu creditava na conta de deus (foi Ele!) e quando as coisas davam erradas, eu não tive fé suficiente. Hoje, vejo como era ingênua minha vontade de defender deus, achando que tudo certo era por causa dele e errado por minha culpa ou do diabo. Ora, todas as ideias e a confiança que eu tive, afinal, vieram da minha cabeça e a confiança era em mim mesmo. Você já ouviu deus? Já o viu? Já o sentiu ou apenas colocou, indiscrimidamente, as vantagens obtidas como dadas por deus e os prejuízos na conta do diabo ou na sua falta de fé?

- Os olhos de deus não me vêem

Eu não vejo nada além, eu não vejo espíritos, não os ouço, não os sinto. Por que deveria acreditar? Acreditei em deus desde a minha infância simplesmente por ter sido imposto para mim. Eu acreditava porque me diziam que existia, mas, eu jamais vi alguma coisa. Eu via vultos pelo canto do olho e quando olhava, nada estava lá: para mim, aquilo era um espírito tentando se comunicar. Deixei de acreditar em espíritos e onde eles estão agora? Não há vultos, não há nada. Deus se esconde daqueles que não lhe tem fé? Pois não são esses que mais necessitam? Acreditar me fazia ver coisas, mas isso não quer dizer que existiam.

- Os ouvidos de deus não me escutam

Nunca perdi um ente querido, não tive um trágico acidente, nada me aconteceu para que eu ficasse com raiva de deus e deixasse de acreditar numa presença divina e é justamente por isso que não acredito! As pessoas só acreditam em deus pelas razões: acreditam desde a infância, “sentiu” a presença de algo maior ou algo terrível aconteceu em suas vidas e ela sentiu a necessidade de apoio. Percebe-se como são motivos infantis, baseados mais na ingenuidade da cabeça e no desespero da pessoa do que em razões fortes, baseadas no pensamento. Por que fé é o contrário da razão? Deus criou um mundo material, mas seu mundo espiritual está protegido contra a inteligência? Tudo que é pensado sobre deus é tido como uma falha: a fé deve ser sentida, apenas, e jamais pensada. Ora, por quê? Deus não tem explicações sobre si mesmo? Nada no mundo espiritual pode ser explicado? A inteligência humana, que “deus” nos deu, tem como principal utilidade a contestação, se “deus” quisesse que acreditássemos sem questionar não teríamos o raciocínio, não é?

Deus não existirá porque o mundo precisa

Deus não existirá porque eu sofro. Deus não existirá porque estou sozinho. Deus não existirá porque tenho problemas a ser resolvido. Deus não existirá porque nasci sem as pernas, porque nasci cego, porque nasci corcunda, porque minha mulher me traiu, porque meus filhos usam drogas, porque o mundo é injusto. A natureza não é justa ou injusta, ela não tem lados. Cada um nasce como nasce e é essa a beleza da vida. Não existir uma vida após a morte torna tudo mais valioso: o que é breve é mais importante e faz ainda mais sentido. Não sinto tristeza por não acreditar em algo além, sinto-me feliz por saber que tudo em vida vale a pena, mesmo as dificuldades. Os problemas, as dores, as tristezas fazem parte da vida e refutá-las como coisas do maligno, do diabo, obstáculos desnecessários para a vida é não desfrutar o que a natureza lhe oferece. Não apenas uma vida cheia de prazeres, mas sim uma vida completa: além do prazer, a dor; além da alegria, a tristeza; além da companhia, a solidão; além da calma, o desespero. Conhecer os lados, ir e vir, faz parte do viver. A moralidade, a ética, o respeito pela humanidade não vem de deus ou das religiões. Sócrates já explicava, séculos antes de Jesus nascer, as vantagens de ser justo comparado com o injusto. A justiça não é divina, é humana e o homem não é superior a natureza. Se a moralidade ensinada pelas religiões, em especial a cristã, fosse especial e divina, o mundo seria melhor, já que a maior parte da sociedade acredita em deus. Mas, ao invés disso, nós aprendemos e erramos e consertamos o errado. Cortamos da nossa vida os ensinamentos morais idiotas da Bíblia como “Apedrejar o filho desobediente até a morte” (Deuterônimo cap. 21, vers. e18-21) ou quando diz que a mulher deve ser submissa e ficar em silêncio na presença do homem e que não exerça autoridade sobre o macho (I Timotéo, cap. 2, vers. 8-15), porque a sociedade aprendeu e não porque deus nos ensinou (visto que “ele nos ensinou” o contrário!). Porque se deus junto com seus ensinamentos da Bíblia ou qualquer outro livro sagrado fosse o único padrão da moralidade e se a sociedade não se adaptasse e usasse sua inteligência para melhorar-se moralmente, estaríamos ainda hoje apedrejando mulheres até a morte e destruindo aqueles que não acreditam em nossa fé (assim como os extremistas e oportunistas do islamismo vivem até hoje e nos horrorizam com suas interpretações estúpidas de sua religião). A única forma que as pessoas podem viver para sempre é deixando um legado para o mundo, uma obra importante para a sociedade e que levará o seu nome e sua utilidade enquanto a humanidade existir. Esta é a eternidade que nos espera.



domingo, 14 de novembro de 2010

Miserável e Maldito Mendigo




Era uma manhã normal de sábado.

Tive que ir à faculdade, perdendo assim, uma partida de futebol dos meus meninos. Ainda bem que eles jogaram em casa.

Resolvi ir de ônibus, assim, economizava gasolina e, aproveitava para continuar minha leitura de "As formas elementares da vida religiosa" de Émile Durkheim.

No percurso de minha casa à faculdade existe um terminal, o terminal de Campo Grande, no município de Cariacica.

Peguei o ônibus aqui em Viana, desci no terminal de Campo Grande, e entrei na fila do outro ônibus em direção à faculdade.

Havia em um banco próximo à fila um senhor, aparentemente idoso, barbudo, sujo, carregando um saco típico dos andarilhos e moradores de rua. Alguns levam sua "casa" nas costas.

Assim que o ônibus chegou, o senhor mendigo entra senta e, nós, os "normais" vamos ocupando os demais lugares, deixando-o "à vontade" em seu banco.

Eu, logicamente bastante perfumado não iria querer sentar ao lado dele.

Sentei de costas no fundo do ônibus porque acho melhor para ler, nas frenagens fico apoiado com as costas no banco e não fico indo e voltando para a frente.

Olhei para trás e vi que uma linda garota havia sentado ao lado do mendigo, logo que percebera o aroma ela se levantou e ocupou o banco do outro lado, na direção do banco que eu estava, também de costas.

Estava tranquilo, lendo e ouvindo música de meu celular. Coloco música para ler, principalmente em inglês, ou apenas música clássica para não ter minha atenção desviada por conversa de terceiros, porque em ônibus sempre tem aqueles que conversam pra todos ouvirem.

Quando o ônibus andava, dava para respirar, quando parava eu treinava minha capacidade de mergulho. Olhava para as pessoas, umas com a camisa no nariz, outras com a cabeça para fora da janela.

Até aí tudo normal.

De repente dois homens começam a conversar. Minha atenção é voltada ao diálogo:
"O fiscal tinha que ter visto isso e não deixar que ele entrasse no ônibus."
"Ele tinha que ser colocado para fora"
"Isso é uma pouca vergonha"

As pessoas começaram unanimemente a concordar com o "massacre do mendigo".

Até aí, tudo normal (?). Sim, por incrível que pareça, era normal.

Um dos homens desceu ao chegar em seu ponto, desejando "boa sorte" aos demais e rindo muito.

Neste instante eu já havia reduzido o volume da música e marcado a página do livro onde estava lendo.

Uma frase do homem que ficara, direcionada aos demais fez com que eu tirasse os fones do ouvido.

"Isso não é de Deus".

Pensei: "Opa, alguém me chamou" (não que eu seja Deus, mas, pelo fato de que Deus está sempre nas frases que ouço no meu dia-a-dia. Sempre tem um que chega e concede autoria de coisas normais ao todo-fuderoso, ops, todo-poderoso. Futebol, lá vem um gol feito graças a Deus. Economia, lá vem um graças a Deus porque troquei de carro. Saúde, lá vem um graças a Deus porque a gripe foi embora. E por aí vai.)

A frase seguinte foi a gota d'água: "Isso não é um ser humano!!!".

Olhei para o homem e veja o diálogo que se seguiu:
Odlave - Se ele não é um ser humano o senhor poderia por gentileza definir para mim o que ele é?
Sujeito - Não, eu não estou discriminando, eu não disse que ele não é um ser humano.
Odlave - Mas foi exatamente o que eu acabei de ouvir. Você disse "isso não é um ser humano". Eu acordei em minha casa, beijei esposa e meus dois filhos, tomei um banho, tomei café, coloquei uma roupa legal, passei perfume Ferrari e estou indo à faculdade. Para mim é muito confortável dizer que este senhor não é gente. Para você também. Agora, eu não conheço ele, você conhece ele? Você sabe o que se passa na vida dele para querer simplesmente colocá-lo para fora do ônibus? Você quer o que? Que ele vá a pé de Campo Grande até a Serra?
Sujeito - Rapaz, eu bebia muito, era para eu estar igual a ele, porém, eu li a Bíblia e conheci a Deus.
Odlave - E daí? Eu te pergunto, e daí? Eu nunca fiz nada para ajudar este senhor e não é por isso que vou chutá-lo para fora do ônibus.
Sujeito - Eu li a Bíblia e conheci a Deus, você já leu a Bíblia?
Odlave - Quatro vezes está bom para você? Já li a Bíblia judaico-cristão quatro vezes, li parte do Alcorão, vedas, livros hindus e budistas, revistas, sites, blogs diversos outros conteúdos sobre religião e não encontrei em nenhum deles argumentos para colocar um mendigo para fora do ônibus. Muito pelo contrário, por ter lido tais livros é que sei que devo respeitá-lo e, se possível ajudá-lo e não discriminá-lo. O mesmo Deus que você conhece ele também conhece.
Sujeito - Deus faz a parte dele mas nós temos que fazer a nossa.
Odlave - Você acha que ele está sem tomar banho e sem comer porque quer? Você acha? Quando eu era criança, um tio meu "surtou", foi a pé de Campo Grande a Guarapari, dias sem tomar banho e sem comer. Ele não foi pelo acostamento, ele foi pelo centro da pista, os carros e caminhões iam desviando dele. Um caminhoneiro que o reconheceu comunicou a nossa família, ele foi encontrado na mesma situação deste homem aqui.
Sabe qual o seu problema? A sua religião te ensinou a ser egoísta, nós os ocidentais somos egoístas, nosso lema é "cada um por si e Deus por todos".
Nós somos mesquinhos e egoístas. Eu sou mesquinho e egoísta.


Observei que o olhar e semblante das pessoas haviam mudado. Olhei no olho de uma senhora e um jovem e percebi que eles haviam agora observado o outro lado da coisa. Antes criticando, agora refletindo.

Chegou ao meu ponto, dei sinal, desci, o mendigo prosseguiu seu caminho, não sei se o verei novamente. Nada fiz por ele. Talvez minhas palavras sirvam para aquelas pessoas, talvez não.

Acho que eu fiquei um pouco nervoso em minhas palavras, o nervosismo faz esquecermos detalhes importantes.

Ao descer do ônibus veio em minha mente algo que eu não poderia ter esquecido. Uma frase do livro "Porque você não quer mais ir à igreja?" que é: "Você realmente conhece Jesus?".

Eu me odiei ("ai, que ódio, rsrs") porque para fechar o assunto deveria ter dito:
"Você diz que já leu a Bíblia e que ela mudou sua vida, certo? Você é cristão, certo? Mas será que você conhece realmente Jesus? Se sim, onde ele tomou banho nos quarenta dias e quarenta noites que passou no deserto? Quer saber, aquele homem é Jesus depois de quarenta dias no deserto sem barbeador, água ou perfume Ferrari. Boa viagem senhor religioso.".


História real, aconteceu dentro do ônibus 591 (Campo Grande x Serra).


Texto escrito por um idiota nada religioso:
Odlave Sreklow.

Imagem: http://www.artshopping.com.br/lojavirtual/images/charge_congresso_mendigo.gif