Em seu ensaio intitulado "Algumas reflexões sobre a psicologia escolar", Sigmund Freud fala sobre o momento em que a criança começa a descobrir que seu pai não é o mais poderoso, sábio e rico dos seres.
Ao vislumbrarem o mundo exterior, descobertas são feitas e mudam sua opinião sobre o pai. Tais descobertas apressam um processo de desligamento com o pai. Porém, o indivíduo não se liberta completamente da imagem do pai, por toda sua vida irá lidar com o desejo da imagem do pai.
Durante seu desenvolvimento o ser humano passará por diversas substituições à figura do pai.
Esta substituição ocorre, por exemplo, quando a criança começa a estudar. Ela vê o professor como o substituto desta imagem do pai onisciente, do detentor do conhecimento.
O processo se repete e, com o passar do tempo, a criança descobre que o professor não é exatamente como ela pensava. À partir deste momento a criança passa então a tratá-lo como fazia com seu pai em casa.
Deus é a figura mais perfeita desta substituição, onde reproduzimos todo nosso desejo do pai onisciente, do pai que pode todas as coisas.
Entretanto, muitas vezes esta imagem do pai não é exatamente atribuída a Deus.
Esta substituição acontece muito no caso da religião, onde atribui-se superioridade a determinado indivíduo. Em todas religiões cria-se uma hierarquia composta por líderes e subordinados, existindo, em algumas delas, graus entre os subordinados e os líderes. Isto faz com que os subordinados se sintam seguros e confortáveis na pessoa do líder.
A figura do líder na religião, além de ocupar o papel de pai onisciente, é visto como alguém superior em todos os aspectos, acreditando-se assim, que o único ser capaz de julgá-lo ou corrigi-lo seria o próprio Deus.
O grande equívoco está na "não percepção" da falibilidade humana também existente em tais representantes.
Assim ocorre o desligamento da criança com o pai biológico, aquele que era um modelo a ser imitado, agora, é eliminado.
No caso do líder religioso atribui-se a ele uma superioridade (na maioria das vezes) não por seu intelecto, por sua sabedoria, mas, por ter a suposta capacidade de dialogar com o próprio Deus, que seria o pai inalcançável fora da estrutura formada por tal líder.
Isso é patente por exemplo na religião denominada "cristianismo" (católico ou evangélico), onde acredita-se que algumas pessoas atingem níveis espirituais mais altos conforme suas ações e cumprimento de regras, dogmas e rituais considerados santificadores.
Esta figura está presente em praticamente todas as religiões.
Não apenas no cristianismo, mas, por exemplo, no budismo, acredita-se em um avanço espiritual através de rituais e negações de sua própria natureza humana, assim, se tornando um ser mais purificado.
Abraços,
Odlave Sreklow.
Prezado Odlave
ResponderExcluirEsse seu artigo está em consonância com o seu comentário e os que fiz ao J. Lima e ao Eduardo sobre a postagem "A Leveza do Ídolo".
Ao ler agora o seu ensaio, é que pude ver a grande coincidência, uma vez que falamos a mesma linguagem, só difereçando no título da postagem.
O ponto forte do cristianismo no qual repousa um dos pilares da psicanálise, é esse:
"Por esse filho chamado Cristo, é que se revela precisamente um pai esvaziado de sua potência, entregue e abandonado às consequências felizes ou infelizes da liberdade e dos desejos humanos".
Passamos a nos entender como irmãos, através de Cristo, inaugurando a fraternidade. Quanto ao Pai todo poderoso o temos agora como símbolo. Por isso, se diz na psicanálise, que o cristianismo se inicia com o "luto de Deus".
Um grande abraço,
Levi B. Santos