Estava deitado, assistindo a uma reportagem sobre a morte de três bombeiros que trabalhavam nos resgates no Rio de Janeiro.
Foi quando pude assistir à entrevista feita a um dos bombeiros sobreviventes ao desabamento que surpreendera seu grupo.
Segue a frase dita pelo bombeiro sobrevivente:
"Perdemos três companheiros, eu tive sorte de sobreviver graças à interferência direta de Deus".
Estas frases e sentimentos são comuns a sobreviventes de desastres, não consigo entender porque algumas pessoas se acham no direito de serem "divinamente" livradas da morte, enquanto outras não tem a mesma sorte.
Ontem um tio meu estava contando que leu uma notícia no jornal que relatava um acidente com dois irmãos em uma moto onde o piloto sobreviveu. Segue frase dita pelo piloto da moto:
"Graças a Deus eu não sofri nenhum arranhão".
O pior é que seu irmão que estava na garupa da moto estava morto ali no chão, próximo a ele.
Este tipo de entrevista é comum, será que nosso cérebro está programado para acreditar que um ser amoroso e misericordioso fora responsável pela nossa sobrevivência a desastres enquanto este mesmo ser torna-se indiferente quanto a outros ao nosso redor?
Li uma reportagem no jornal A Tribuna de ontem onde estava relatada uma "experiência" de uma família evangélica. Não lembro exatamente se eles perderam familiares nos desabamentos ocorridos no Rio de Janeiro ou se receberam notícias que estavam vivos. Disseram que iriam viajar para lá.
Uma jovem, ao receber a notícia sobre os familiares, abrira a Bíblia em Isaías 40, onde lê-se "Consolai, consolai o meu povo, diz o vosso Deus.".
Estavam se preparando para ir ao Rio, porém, foram à igreja naquela noite e "Deus" falou com eles: "Vocês não devem ir ao Rio de Janeiro amanhã porque se forem irão morrer na estrada".
Imagino eu o quanto estas pessoas se acharam importantes para "Deus", pois, "Deus" esquecera de fazer o mesmo com as seiscentas pessoas que morreram no Rio. "Deus" utilizou sua infinita capacidade de onisciência para salvar uma família, aleluia, enquanto isto, ele não fora capaz de avisar aqueles que foram soterrados.
Somente pelo pequeno trecho da entrevista desta jovem evangélica já deduzi qual igreja ela frequenta (não vou comentar porque não vem ao caso).
Mas é algo típico desta determinada igreja evangélica, e, sem obter detalhes de como "Deus" havia feito o comunicado posso dar meu relato de como deve ter ocorrido.
Creio que esta família foi ao culto para cumprir agenda. Estavam tristes e debilitados com as notícias recebidas sobre os familiares. Ao término do culto devem ter chamado um daqueles que vestem paletó e oram colocando a mão na cabeça das pessoas e disseram: "Nós pretendemos ir ao Rio amanhã mas gostaríamos de consultar a 'Deus' para saber se podemos ir". Em seguida ajoelham, enquanto juntam-se ao homem de paletó mais algumas pessoas (todas influenciadas por dezenas de notícias que estão sendo exibidas a semana toda), e, após orarem pela família que pretendia viajar, um daqueles que estavam de pé, orando pelos ajoelhados diz: "O Senhor me revelou que vocês não devem viajar porque senão irão morrer na estrada", ou pode ter sido: "Quando orávamos por eles, o Senhor me deu uma visão onde eu via o transporte que eles estavam (isso quando não dizem de que vão viajar) sofria um acidente e todos morriam".
Pois é, assim caminha a humanidade, onde o "Deus" todo-poderoso seleciona quem ele quer que continue vivendo ou não.
É mais fácil ir se iludindo assim do que acreditar que não há nenhuma interferência "divina" diante das calamidades e catástrofes da vida.
Mas nem tudo está perdido. Vi uma outra entrevista a uns dias atrás onde uma senhora estava sentada em um banco de praça chorando e disse: "Na minha vizinhança apenas minha casa ficou de pé, saímos correndo, desesperados, muito barulho, meus vizinhos perderam tudo, meu Deus, o que vai ser deles?". Isso mesmo, este é o tipo de pessoa difícil de se encontrar, a pessoa realista, que se preocupa com o próximo. Porque o comum seria ela dizer: "Graças a Deus que minha casa não desabou, aleluia, Deus é bom." sem mesmo se preocupar com os vizinhos. Daí concluo que esta senhora não seja uma "serva de Deus", porque se fosse, ela não perderia a oportunidade de exaltar ao seu "Deus" por ter colocado as "mãos" sobre sua casa.
Fim do relato.
Odlave Sreklow.
As tragédias ocasionadas pelas chuvas e pela falha humana, com uma grande parcela de culpa do poder público, ao meu ver deixa bem claro a minha teoria de que as coisas são como são.
ResponderExcluirSe Deus optasse por livrar esse ou aquele estaria sendo injusto com os demais e Ele segundo a Bíblia, não faz acepção de pessoas (mesmo tendo um povo - difícil de entender né?).
Porém, meu caro Odlave, algumas pessoas, em sua maioria evangélicas, acham-se propriedade exclusiva de Jesus e acham todos aqueles que não professam a mesma religião que eles: perdidos, amaldiçoados e por aí vai. Daí a afirmação de que Deus os livrou porque eram "fieis" e os outros provavelmente não eram.
Já os que usam um pouco a razão, sabem que a sorte de alguns sobreviventes dependeram apenas de estar no lugar certo na hora certa e pedem a Deus força para que eles passem pelas grandes dificuldades que virão.
É exatamente aí que Deus (na minha opinião) poderia entrar sem ser injusto, dando a força necessária para recomeçar.
Qualquer coisa além disso é injustiça e é fruto do puro egoísmo humano.
Grande Abraço
Tem um frase de que gosto muito e que também se encaixa nesse contexto.
ResponderExcluir"A benção do gato é a maldição do rato, quem nasce do lado gato, dificilmente se importa com o outro lado."
Peço autorização para postar esse seu texto em meu blog Odlave.
Grande Abraço!
Fala Edvaldo.
ResponderExcluirRapaz, esse seu relato tem suas razões. Não vou comentar sobre seu ateísmo no post porque não vem ao caso, mas me solidarizo a essa senhora que chorou pelos vizinhos. Chorei em ver as cenas dessa tagédia. Dezenas e dezenas de pessoas mortas por incopetência das autoridades e imprudência das pessoas. Mesmo não tendo onde morar, poderiam se preocupar mais com suas vidas e de suas famílias. Espero sinceramente que os governantes que pensam apenas em obras com vistas politiqueiras revejam e comecem a tirar as famílias das áreas de riscos, fazendo um plano habitacional digno para remanejá-las.
Agora, sobre gente dizendo "aleluia" por estar vivo, há as duas faces da moeda (para mim pelo menos, para você só ha uma): se fosse meu caso, daria sim Gloria a Deus por está vivo, pois tenho mulher e filho e ficaria muito feliz de ficar mais tempo com eles e, ao mesmo tempo, choraria pelos mortos, como chorei apenas vendo a tv, pois ver famílias inteiras sendo destruídas não deixa feliz o coração daqueles que realmente conhecem a Deus (não to falando do espírito evangélico).
"E, NAQUELE mesmo tempo, estavam presentes ali alguns que lhe falavam dos galileus, cujo sangue Pilatos misturara com os seus sacrifícios.
E, respondendo Jesus, disse-lhes: Cuidais vós que esses galileus foram mais pecadores do que todos os galileus, por terem padecido tais coisas?
Não, vos digo; antes, se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis.
E aqueles dezoito, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou, cuidais que foram mais culpados do que todos quantos homens habitam em Jerusalém?
Não, vos digo; antes, se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis."
Jesus nunca disse que as catastrofes cairiam apenas nos "perdidos". Isso é invenção importada dos EUA, principalmente nesta era de "Confissão Positiva", onde se engloba também essa "blindagem".AI já viu, a crentaiada acreditou, principalmente porque é dissiminada pelo R. R. Soares e pelo Macedo.
Ao final de tudo, você diz que não acredita na Bíblia nem e Jesus e blá blá blá blá... coisas de ateu mesmo,rsrsrs.
Abçs de um ateu das meninices evangélicas.
Grande Alexandre,
ResponderExcluirTens autorização para replicar qualquer post em teu blog.
A frase da bênção do gato é tua? Achei muito boa, nunca tinha visto algo do tipo.
Se for tua peço permissão para colocar no meu MSN, gostei mesmo, rsrs.
Querido Ednelson,
O texto relata casos verídicos exibidos na TV ou impresso em jornais.
Em momento algum neste post relatei a não crença em Jesus ou na Bíblia, apenas relatei meu lado medíocre-humanitário em protesto à percepções equivocadas de atos benéficos advindos de divindades inexistentes nesta dimensão.
Ou você acha que um ateu é um ser desprezível que não se importa com as pessoas ao seu redor?
Cuidado com suas "percepções ateístas", rsrs.
Um beijo de seu irmão ateu.
Odlave Sreklow.
Permissão concedida meu caro, apesar da frase não ser minha! Li ela no blog de Texto em texto se não me engano e gostei muito! Daí virou meu chavão diário!
ResponderExcluirQuanto ao seu texto, você demorou pra autorizar e eu postei assim mesmo, o que me rendeu 2 comentários!Rs.
Grande abraço!
Odlave, lembrei de ti: vejas como esse deus está de brinks com a galera: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/862272-biblia-da-camara-de-franco-da-rocha-sp-fica-intacta-apos-inundacao-diz-vereador.shtml
ResponderExcluirdetalhe 1: o que diabos fazia uma biblia numa câmara municipal?
detalhe 2: deusinho de merda esse hein? salve o livro, mas quanto às pessoas, que se fodam.
Odlave
ResponderExcluirIam dois numa moto: o crente morreu e o "incrédulo" escapou.
Comentário da crentaiada:
Deus tinha um propósito em levá-lo.
Em outro acidente (agora de automóvel) morreram três "incrédulos" e o que era "crente" escapou.
Comentário da crentaiada:
Estão vendo!? Estão vendo?!
Deus livra os que são Dele. Agora não creiam não!!!
Eu ouvi mais coisas que não é lícito se contar (à la Paulo), sobre esse dois acidentes que ocorreram numa mesma semana, aqui perto de onde eu resido.
"O inferno são os outros", já dizia Sartre.
Levi,
ResponderExcluirComo sempre, dissestes tudo, Sartre sabia o que estava dizendo.
Abraços,
Odlave Sreklow.
Bom dia!
ResponderExcluirMoro aqui em Nova Friburgo, uma das cidades atingidas pela tragédia das chuvas da Região Serrana do Rio de Janeiro e sou muito grato por estar vivo junto com minha família, bem como não ter tido qualquer prejuízo direto, exceto pela lama que sujou a rua onde moro, sem causar qualquer abalo à estrutura do imóvel.
Vejo uma atitude dessas como a expressão de um profundo sentimento de gratidão por estar vivo, pela vida ter dado uma nova oportunidade da pessoa continuar. Uma nova chance para compreendermos o propósito de nossa existência aqui neste planeta e na sociedade onde estamos.
Não creio que seja presunção da vítima agradecer a Deus pela não ocorrência do fato, entendendo aquilo como um livramento. A experiência de escapar de uma tragédia é algo rico de significados que, pelo menos de imediato, faz com que o sobrevivente perceba a brevidade da vida e a sua real dependência do Eterno, passando a reverenciá-Lo.
Como explicar que a minha vida foi poupada e a do meu viziho, que morava a algumas quadras de mim não?
Sinceramente não sei e nem quero ter a presunção de me colocar no lugar de Deus, sendo que já ouvi pessoas dizendo que as tragédias que ocorreram aqui foram algum julgamento divino ou castigo pelos pecados. Mas longe de mim esteja uma presunção de explicar metafisicamente o porquê das tragédias e cometer o mesmo erro dos amigos de Jó.
Apenas sei que a natureza não faz acepção de pessoas e que, de alguma maneira, temos responsabilidade coletiva por estas mortes e prejuízos, visto que a nossa espécie tem contribuído com a emissão excessiva dos gases do efeito estufa e construído suas habitações em locais impróprios. E tudo isto decorre da nossa falta de ética, visto que tratamos a natureza e o nosso semelhante com grande indiferença de modo que, coletivamente, recebemos o retorno daquilo que plantamos.
Concordo com a atitude da senho que preocupou-se com o próximo e acho que a conduta dela não exclui o sentimento de gratidão que devemos ter por cada manhã que se levanta, sem nos arrogarmos em dizer que uma tragédia ocorreu por razões de um julgamento sobrenatural específico.
Olá Rodrigo,
ResponderExcluirObrigado pela visita.
Que bom que foi seu vizinho que morreu e não você. Aleluia, Jesus te ama. (ironia genérica, nada contra você, Jesus ou seu vizinho, rsrs.)
Abraços.
Odlave Sreklow.
Odlave meu mano, graça e paz!Prazerem conhecer seu blog, e que bom saber que temos algo em comum além de termos sido alcançados pelo Caminho da Graça (Jesus) e agora caminhando na Graça do Caminho (Jesus).
ResponderExcluirTranscrevo abaixo alguns pensamentos que reparti com nossos irmãos na Estação de Várzea Paulista - S.P. sobre o texto e assunto em questão.
Tragédias São repentinas e não são seletivas
Não mandam aviso prévio nem escolhem endereço.
Comprovam a transitoriedade e a fragilidade da vida humana.
Espiritualidade não é garantia de imunidade
O mito de que Deus sempre vai dar livramento aos seus, é uma fraude.
São momentos de reavaliação e re-significação da relação com...
Deus: Aprendemos o valor do relacionamento com Deus.
Próximo: Aprendemos que somos interdependentes uns dos outros.
Consigo mesmo: Aprendemos a ser sensíveis com os valores que realmente importam.
Valeu mano, um abraço,
Franklin Rosa
Franklin,
ResponderExcluirObrigado pela visita e um grande abraço.
Odlave Sreklow.