Era apenas um garoto que mal tinha tempo para exercer as principais tarefas de uma criança que é aproveitar este momento único para brincar, descontrair-se e não se importar com o futuro.
Mas nada disso fazia parte de sua época de adolescente devido à cultura à qual fora inserido.
Desde cedo assumiu responsabilidades que deveriam ser atribuídas apenas aos mais velhos, porque? Porque todos da sua tribo foram criados assim.
Em seu país, meninos são vistos com armas nas mãos.
Nos dias atuais, metralhadoras automáticas, mas, em sua época, espadas, lanças e escudos.
Seus amigos eram seus animais, por isso os defendia com unhas e dentes como se fossem seus próprios filhos.
Não haviam bolinhas de gude, pipas, carrinhos de rolemã, skate ou playstation.
Sua brincadeira era usar pedras como armas.
Apesar de parecer coisa de criança, aquelas pedras eram mais eficientes que qualquer espada, pois podiam acertar a ameaça de longe, trazendo assim mais segurança para o garoto.
Ah, como ele queria ser grande.
Ele não sabia que este tempo não voltaria depois, quem dera ele soubesse que ser grande não era tão bom como imaginava.
Fora sua puberdade precoce que o fizera ir ao encontro dos grandes guerreiros de sua tribo para observar como iam na batalha.
Era um garoto que sonhava com a guerra.
Não havia um instrutor de luta ou de artes marciais, sendo assim, o garoto treinava com as feras da floresta.
Eram leões e ursos seus adversários.
O que eu diria para um de meus filhos se fizessem tal "arte".
Era óbvio, ou se transformava logo em um homem ou seria presa fácil da vida que lhe oferecera o destino.
Certo dia, se oferecera para um cargo que fora recusado por muitos.
Era como assumir a gerência de uma empresa falida.
Mas ele não conseguia olhar apenas aquele momento, seus pensamentos iam além, o garoto olhava o futuro, seus olhos brilhavam.
Não era valentia, aquele menino homem não passava de um artista e sonhador.
Os adultos zombaram dele.
Diziam "Você? Logo você vai conseguir nos reerguer? Nos tirar do sufoco? Virar o jogo? Aos quarenta e cinco do segundo tempo? Esse técnico ficou louco?".
Mas o jovem dizia "Posso bater a falta professor?".
O "professor" Saul não tinha alternativas, olhou para o banco de reservas e viu quem? Somente homens adultos amedrontados.
O grande e sábio rei não tinha escolha.
Porque ele enviaria tão jovem garoto à morte? É um delírio, é loucura.
E foi o garoto como se fosse jogar sua primeira partida de "Mortal Kombat" no PlayStation.
Pegou sua arma, catou algumas pedrinhas, enquanto ouvia fortes homens rirem e perguntarem o que estava fazendo.
Só tinha uma certeza, a de que se existia alguém que se importasse com a justiça estaria ao seu lado.
Mas o tal justo não poderia estar do lado daquele que me ameaçava, já que nosso povo também invadiu estas terras destruindo seus moradores?
Nesta hora isto não importava, importava somente pegar o diploma da faculdade, mesmo antes da hora.
Após aquela batalha, onde ele mostrou para sua tribo que já era um homem por ter vencido a luta e matado aquele que os ameaçava, iniciava-se uma carreira não esperada.
Iniciava-se o momento dos holofotes estarem voltados para ele.
Foi um passo para se tornar rei, um jovem rei.
Inexperiente, sem muito conhecimento de vida, amadurecendo "na marra".
Um novo mundo surgia, não precisava mais trabalhar de sol a sol, agora tinha quem fizesse tal coisa para ele.
Comida e bebida, era só pedir. Roupas, escolher. Mulheres, chamar.
Assim se tornou sua vida.
Mas se tornar adulto tão rápido traz à tona alguns problemas mal-resolvidos no passado. Principalmente na vida amorosa.
Foi aí que, mesmo tendo diversas mulheres à disposição em seu harém, seus olhos brilharam por outra.
Era a mulher mais bela que já conhecera, para mim, deve ter sido importada das bandas do Brasil.
Desejos sexuais não vividos em sua juventude surgiam à flor da pele.
Ele se envolveu com tal mulher, que não era livre, mas que nada pôde fazer para se opor ao desejo do homem mais respeitado, honrado, porém perigoso de sua tribo.
Foi uma noite maravilhosa de sexo, ele pôde saciar desejos que haviam se acumulado em seu inconsciente que nenhuma mulher de seu harém jamais saciou. Fizeram sexo como dois animais, de todas as maneiras e formas. Suas mentes foram desligadas, somente estavam ativos seus corpos e órgãos genitais.
Porém, no dia seguinte a coisa foi diferente.
De um lado a mulher que sofria com a culpa de ter traído um marido honesto, homem de valor, um guerreiro que a amava muito, que nunca deixara faltar nada, muito menos carinho e sexo. Ela tinha tudo o que queria, e se perguntava "Porque? Porque?".
Do outro lado o homem mais poderoso do reino, porém, o mais angustiado, a tristeza e a dor o consumiam.
Não queria sair de seu quarto, se sentia mal.
Em sua tribo era comum usar sexualmente mulheres de outros homens, porém, quando estes homens e mulheres eram estrangeiros, inimigos vencidos em batalha.
Nunca fora permitido usar sexualmente uma mulher de alguém que fosse seu amigo e convivesse pacificamente como era o caso do marido guerreiro e fiel.
Ele dizia "Eu traí um amigo meu".
Havia criado um problema que não sabia como resolver, à sua disposição estavam todos sábios e anciãos da cidade.
Mas naquele instante, habitava dentro de si não o homem rei que de forma forçada se tornara, mas, o menino indeciso que sempre fora.
O que fazer? Teve um plano, provocar a morte do marido e assim, ter o caminho livre para tomar a mulher para si.
Assim fizera.
E após a morte daquele homem, o fantasma da culpa os assombrava.
A mulher gerou uma criança.
Esta criança simbolizava um erro, e toda noite, a cada choro do bebê, era como se fosse o lamento daquele homem caído na batalha.
O grande rei e sua nova mulher não conseguiam viver uma vida tranquila.
Não havia amor pela criança, havia desprezo porque a criança era o espelho de seus erros.
O que acontece com um ser humano que não é recebido neste mundo com amor? O que acontece quando um filho não se sente "ligado" com a mãe mesmo após o corte do cordão umbilical?
Era difícil para uma criaturinha tão inocente e insegura sobreviver assim, com um pai e mãe que, embora cuidassem e se preocupassem, deixavam escapar de seus olhos tristeza, angústia e uma certa rejeição pela criança.
Devido à este quadro, a criança enfraquece, adoece.
E agora? Pergunto eu, era castigo dos deuses? Na mente deles sim.
A criança morre, cuidados médicos não são dispensados, apenas aguardam a morte da mesma. O que fazer? A decisão deles foi apenas ficar sem comer e chorar porque achavam que era castigo divino.
Após a morte da criança o rei pede um banquete e se alimenta, agora a vida continua.
"Bola pra frente".
Esta criança ao andar no palácio seria como uma assombração, seria a ressurreição dos nossos erros, agora, não existe mais.
A mulher engravida novamente.
Nasce outra criança.
Permanecia a culpa pois, sendo filho da mulher de um homem que o rei causara a morte, era como se fosse o filho daquele mesmo homem, pois de certo seria, o rei se introduziu na árvore genealógica daquele homem tomando seu lugar.
O rei tinha diversos filhos, a hora de sua morte chegara, com a velhice a responsabilidade de entregar a tribo à um de seus filhos.
E sabe qual foi escolhido? Sim, o filho da mulher do guerreiro que ele havia causado a morte.
Mas porque?
Era a única forma de honrar aquele homem, colocando a coroa na cabeça daquele que teria sido seu filho e assim morrer e, caso se encontrasse com aquele homem, poderia dizer que sua mulher virou uma das mulheres mais ricas do reino e, que aquele que seria seu filho, se tornara um rei.
E assim termina esta história.
Odlave Sreklow.